sexta-feira, 20 de novembro de 2009

A MÃE PRETA!


A MÃE PRETA
Afinal,o dia dela chegou;dia de homenagear um dos pilares na formação social e cultural da família brasileira nos séculos XVIII e XIX,a ama-de-leite,a mãe preta,que forjou a personalidade de muitas gerações de brasileiros,principalmente no Nordeste.
As iaiás coloniais casavam muito cedo,não só para proteção contra os apelos da carne,como também,pela escassez de mulheres brancas ,indispensáveis á formação das famílias brasileiras.
Meu S. João.casai-me cedo
Enquanto sou rapariga,
Que o milho rachado tarde
Não dá palha,nem espiga.
A ama era figura fundamental na Casa Grande.Era escolhida pela docilidade,pela higiene,pela força(física e espiritual)e pela beleza.A maioria dos criados de dentro eram angolanos,que logo se adaptavam ao dia a dia dos Engenhos e assimilavam facilmente os costumes e a religião dos brancos,embora jamais perdessem suas características africanas,como o linguajar “mole” e as crenças nos seus deuses primitivos.Pelo contato com as Iaiás,tornavam-se quase pessoas da família,confidentes e leva-e-trás das mocinhas e senhoras.
Mas,a função principal da ama era criar o sinhozinho,amamenta-lo,cuida-lo,embalar a sua rede,ensina-lo a falar e a rezar,enfim
,era responsável pela saúde,pela higiene e pela formação do futuro senhor de engenho.
Uma boa ama tinha que ser corpulenta,carinhosa,seus peitos deviam ser nem muito rijos,nem moles demais,os bicos nem muito ponteagudos,nem encolhidos,segundo o médico J,B.A. Imbert.Pela boca da ama ,os guris aprendiam as primeiras palavras,os ôxente,os pru mode,absorviam superstições,como o bicho papão,o homem do surrão e o saci pererê ,o curupira.A negra “amaciou a língua portuguesa,para desespero dos padres puristas,como fazia com a comida dos nenén,tornando a carne dura mais palatável,com o molho de ferrugem,e,o pirão mais comível,com o amassado das verduras e os caldos suculentos.As palavras,como o alimento,desmanchavam na boca.Daí vieram as palavras Cacá,bumbum,pipi,dindinha,au-au,tatá,neném,mimi,cocô,e os apelidos,as transformações dos nomes próprios portugueses:Antonio,virou Totonho,Tonho;Francisco,Chico,Chiquinho;Teresa,virou Teté;Manoel,Nézinho ou Mané;Maria,Maroca,Mariquinha,e,por aí vai.Sem esquecer os diminutivos:ioiô.iaiá,nhonhô,calu,sinhá,sinhozinho,como era chamado meu avô,com tanta freqüência que,poucos sabiam seu nome de batismo,Antonio Jerônimo.
As amas e mucamas também eram responsáveis pela iniciação sexual das iaiás e sinhozinhos,ensinando-lhes os mistérios do sexo,assunto tabu,entre as senhoras brancas;meninas que se casavam quase sempre depois da primeira menarca,com senhores mais velhos,escolhidos pelos pais,inocentes de tudo que se passava no leito conjugal,não fosse pelos “ensinamentos” das escravas.
E,as orações,então!?Ainda me lembro que aprendi e ensinei a meus filhos e netos ,as orações que minha mãe aprendeu de minha avó,que aprendeu das negras:
Com Deus me deito
Com Deus me levanto.
Com a graça de Deus
E do Espirito Santo.Ou.
Santo Anjo do Senhor,meu zeloso guardador,se a ti me confiou a piedade divina,sempre me rege,guarda,governa,ilumina amém.Ou,ainda:Sta.Anna bendita
Rogai com affecto
Por nós miseráveis
A Deus,vosso netto.(escrita no português da época).
No dia dedicado à consciência negra, rendo minhas homenagens a essas mulheres extraordinárias,que tiraram o leite de seus filhos para alimentar e nutrir os filhos de seus algozes e lhes ensinou,além dos mistérios da vida,o amor,a confiança,as crenças e os valores que hoje são o alicerce das sociedades modernas.

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