quarta-feira, 11 de agosto de 2010

AS MORTES DE QUINCAS BERRO D’ÁGUA






Palestra proferida no” Clube do Livro Saraiva”,31/7/10

O Começo

Estava Jorge Amado posto em sossego na sua casa do Rio Vermelho,mergulhado nas tramas do seu novo romance,o capitão de longo curso,que logo seria nomeado “Os Velhos Marinheiros”,quando Scliar,seu amigo de longa data o convidou a escrever um conto para a revista Senhor.

Jorge enfezou,não queria misturar as coisas,mas,acabou cedendo pois Jorge nunca deixava um amigo em apuros.

O Personagem

Nasceu assim Quincas Berro D’ Àgua um vagabundo que não nascera vagabundo e um defunto de muitas mortes que não aconteceram.

O personagem,nascido a contra – gosto,foi se impondo,ganhando vida,abrindo caminhos,independente e mandão,como devia ser.Do tipo que punha a língua para seu criador e não ligava a mínima para o que se esperava dele.Que era figurar tranqüilinho nas páginas da revista até sua morte quando a revista saísse das bancas e caísse no ostracismo como acontece com todas,até as das melhores famílias editoriais.

Mas,quem disse que o Quincas ficou convencido?Deu uma banana pro conformismo,ganhou a rua,freqüentou outras publicações de gringos,transformou-se em livro,conquistou fama.

A Verdade

O que a maioria dos leitores de Jorge e amigos de Quincas não sabiam é que esse trem ruim tinha nome, endereço e naturalidade.O danado não era baiano,mas,cearense,também vinha de boa família,chamava-se Wilson Plutarco Rodrigues Lima,dono como vêem os senhores de um nome pomposo,era cabo da polícia,farrista e foi enterrado em terra firme,no Rio de Janeiro,carneiro 6059 do Cemitério do Caju.

No mais é tudo parecido entre o Quincas criado pelo escritor e o verdadeiro vindo das terras do Ceará.

E como o criador descobriu a criatura?

Ora como, de ouvir falar...Para isso se fazem os romancistas,para terem orelhas longas e olhos abertos prontos para enxergar o Irreal dentro do óbvio.

O escritor está ai para captar a realidade usando suas antenas especiais,sendo por isso um sujeito de utilidade pública,aquele que redistribui e potencializa as energias emitidas ao seu redor.

O próprio Jorge contou que soube deste patético futuro personagem na casa de amigos em Fortaleza, mais precisamente na boite Maracangalha,que lhe narraram a estória deste boêmio cujos amigos transformaram em festa a dor da despedida.

A Literatura Amadiana

Quincas,o das muitas mortes e vida eterna,é a cara da literatura amadiana onde o arlequim suplanta o pierrot e o reprimido,o marginal ri-se da sociedade civilizada e hipócrita tão logo rompe com seus paradigmas.

E foi assim que o honesto funcionário público Joaquim Soares da Cunha,depois de anos de vida chata e metódica,chutou o pau da barraca e ganhou o mundo;não sem antes chamar de jararacas a mulher e a filha.

E digo mais:todos nós somos um pouco Quincas o que nos falta é coragem de cair na vida.

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