quarta-feira, 31 de março de 2010

EDUCAÇÃO


A movimentada década de 1960 numa Londres que se modernizava rapidamente depois dos anos difíceis da 2a Guerra é o cenário onde uma jovem de 16 anos, Jenny (Carey Mulligan, de "Inimigos Públicos") viverá seus anos de descoberta e um desafiador ritual de amadurecimento. Ela é a protagonista da comédia dramática "Educação", que concorre a três Oscars - entre eles, melhor filme - e estreia em circuito nacional nesta sexta-feira.
Filha de pais da classe média que se esforçam para garantir seu futuro e seu sonho de estudar em Oxford, Jenny é uma das alunas mais aplicadas de sua escola. Sua vidinha regrada e fascinada por qualquer coisa que venha da França - de música a filmes - sai completamente de órbita quando ela conhece um homem 20 anos mais velho, que lhe dá carona numa tarde chuvosa depois da aula de violoncelo.
Ele é David (Peter Sarsgaard, de "A Órfã"), homem sem estudo formal que diz ter se formado na "universidade da vida". Com seu jeito sedutor, ele cai nas graças não apenas de Jenny, mas também dos seus pais, Jack (Alfred Molina, de "O Código Da Vinci") e Marjorie (Cara Seymour, de "Adaptação"). David representa para a protagonista tudo aquilo que ela sempre sonhou, especialmente a liberdade.
Mas David não é bem aquilo que aparenta ser. Sem nunca entender ao certo como ele ganha a vida - ainda que perceba que não é de uma forma muito honesta -, Jenny acaba deixando seus limites morais pouco a pouco de lado. Afinal, a vida dela nunca foi tão empolgante, os estudos tão enfadonhos, e o sonho de conhecer Paris nunca antes esteve tão perto de realizar-se - ainda que apenas numa visita de final de semana.
Qual educação conta mais? Aquela que se aprende nos bancos escolares, ou aquela, como a de David, na chamada "escola da vida"? Como tantos outros questionamentos sérios da existência das pessoas, não há uma única resposta. No caso de Jenny, uma combinação das duas, embora um tanto dolorosa, molda o seu caráter. "Educação" é, basicamente, um filme sobre uma garota descobrindo que o mundo é muito maior do que os sonhos que seus pais criaram para ela.
Se por um lado trata-se de uma história um tanto explorada pelo cinema, a interpretação magnética de Carey - indicada ao Oscar - traz um frescor para a personagem que, enquanto arquétipo, é tão antigo quanto a literatura. Ela poderia ser uma heroína da escritora inglesa Jane Austen, ou a protagonista do romance "Jane Eyre", a quem, aliás, Jenny é comparada numa aula na escola, quando começa a envolver-se com David.
David é um personagem condenável por motivos legais, morais ou até mesmo éticos. Mas o filme assume o ponto de vista de Jenny. Então, de seu ponto de vista, ele representa a descoberta e a diversão que ela jamais teria em sua vida, não fosse exatamente por seu intermédio. Por isso, nunca há um julgamento em relação ao personagem dele.
Para que "Educação" funcione, de um lado está a interpretação de Carey. De outro, a forma como o roteiro (também indicado ao Oscar), assinado pelo escritor Nick Hornby ("Alta Fidelidade", "Um grande garoto"), segue a evolução da personagem e o desenvolvimento do romance. Não há pressa para que as coisas aconteçam, tudo tem o seu tempo, o seu ritmo próprio. O roteiro, aliás, baseia-se no livro de memórias da jornalista inglesa Lynn Barber.
Carey é dessas atrizes que conseguem trazer o público para o lado de sua personagem. Mesmo quando se sabe que algo pode dar errado, que ela pode se machucar, perder alguma grande oportunidade ou qualquer coisa assim, o público torce para que, no final, dê tudo certo, porque ela faz por merecer.
A direção da dinamarquesa Lone Scherfig ("Meu irmão quer se matar" e "Italiano para principiantes") capta um momento de transição da capital da Inglaterra, ainda vivendo sob o código rígido e austero do pós-guerra mas dando os primeiros passos para a efervescência cultural daquela que seria chamada de 'swinging London' (tão bem retratada em "Blow Up - Depois daquele beijo", de Michelangelo Antonioni).
"Educação" prova que os fins justificam os meios - mesmo quando esses meios são bem diferentes daqueles planejados por nossos pais. A trajetória de Jenny e a conquista de sua liberdade acontecem por caminhos tortuosos, mas, ainda assim, prazerosos - do contrário, jamais poderiam ser chamados de "anos incríveis".
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)

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